Com proposta inviável para empréstimo, oposição perde seu melhor momento na disputa de narrativa sobre os investimos de Raquel Lyra
Diz a sabedoria popular que o apressado come cru e quente. Certamente isso aconteceu quando, ao receber o pedido de empréstimo de R$ 1,5 bilhão da governadora Raquel Lyra, o presidente da Comissão de Finanças da Assembleia Legislativa de Pernambuco, Antônio Coelho pensou numa forma de criar um fato político apresentando e aprovando, em apenas uma sessão do colegiado, a destinação de metade dos recursos com 184 municípios o que, tecnicamente, é impossível.
Deputado com formação em Economia e Ciência Política pela New York University dos Estados Unidos, Coelho sabia da inexequibilidade da proposta. Entretanto, o que não avaliou foi que, com um projeto ancorado numa espécie de conta de padaria, tiraria da oposição um fortíssimo argumento contra Raquel Lyra para questionar a aplicação dos recursos já aprovados.
E a perda, na opinião pública, da narrativa fomentada pelos apoiadores da governadora de que o Legislativo está impedindo o desenvolvimento do estado.
Narrativa perdida
Não está. Mas a oposição perdeu a narrativa é uma grande oportunidade de encaminhar um debate sério diante do fato de que, após 30 meses, depois de o Legislativo conceder à governadora R$ 7,5 milhões em autorizações de empréstimos, ela ter contratado apenas R$ 3,73 bilhões, que subiram para R$ 4,82 bilhões com uma parcela de R$1,08 bilhão que está sendo creditado esta semana pelo Banco do Brasil.
A tese política no embate é que Raquel Lyra não consegue gastar todo o dinheiro que pode contratar nos bancos. A crítica vem de dados públicos disponíveis. E num embate mais refinado esse seria, sem dúvida, um bom argumento.
Ideia ruim
Seria. Se a conta de padaria de Antonio Coelho não tivesse sido aprovada e hoje travar a aprovação do empréstimo já que para que a solicitação oficial do Executivo possa ser votada, primeiro será necessário derrubar a proposta do deputado de Petrolina.
Com maioria na Casa, se o texto chegar ao plenário, certamente o pedido será aprovado. Mas enquanto a Comissão de Finanças não encaminhar, o pedido está travado. E a Assembleia vai perdendo tempo de seu discurso.
Sem as comissões
E tudo isso depois de a governadora ter conseguido algo inimaginável na história das relações com o poder Legislativo (ela perdeu o comando de todas as comissões permanentes na casa), o que expõe a verdade de que só agora a oposição tenta colocar um discurso mais consistente.
O problema é o fato de Raquel Lyra estar na mídia falando de projetos importantes todos os dias. E estimulando seus líderes na casa a fazer até mesmo obstrução para votar matérias tendo maioria. O que obrigou a oposição, levantar dados e reagir e com números que mostram as dificuldades do Executivo. Mas está dificil.
Captar tudo
E elas têm origem na própria estratégia da governadora (já nos primeiros meses de sua gestão) que atuou para conseguir captar o maior volume de recursos que pudesse de modo a ter um colchão de segurança para seu programa de obras até 2026.
Depois de “50 viagens a Brasília”, ela não só pode captar o limite que a Secretaria do Tesouro Nacional lhe autorizava, como usou até mesmo uma autorização que a Assembleia deu ao então governador Paulo Câmara, o que lhe possibilitou antecipar um empréstimo de R$1,1 bilhão.
Sem equipes
Os problemas da governadora começaram quando constatou que não poderia contar com pessoal técnico para escrever editais de licitação, desenvolver projetos dentro das próprias secretarias e avançar nas contratações de obras.
Na prática, o governo tinha uma dinheirama de empréstimos contratados ou a contratar, mas não podia implantar um ritmo de obras que pudesse dar maior visibilidade porque os editais não saiam.
Juntos e devagar
E mesmo ao conceber, em 2024 os mega projetos nas áreas de saúde, recursos hídricos, educação e segurança embalados na marca “Juntos”, as contratações vem saindo a conta gotas.
Projetos como o de 240 creches, 2 mil câmeras de vigilância e reforma dos grandes hospitais e o Arco Metropolitano só agora estão deslanchando ou com um maior ritmo. A governadora tem tido sucesso no setor de estradas. Mas mesmo os concursos para a contração de 7.200 novos soldados só em agosto formará a primeira turma de 2.400 praças.
Novo empréstimo
Curiosamente, a oposição até o evento do empréstimo de R$1,5 bilhão não se apresentou. Mesmo podendo contar com uma base de dados que permitisse questionar a governadora, por exemplo, pelos atrasos das parcelas do empréstimo de R$1,7 bilhão de junho na Caixa e que precisou de aditivo de prazo, ela não de nunciou os atrasos.
E eles poderiam – como fizeram agora – buscar maiores informações sobre os demais empréstimos que estão previstos em autorizações e que formam o pacote de R$7,5 bilhões E denunciar os atrasos quando se sabe que o Executivo consumiu prazos de carência de empréstimos na Caixa.
Ordem de serviço
A governadora acredita que, a partir de julho, com o pleno funcionamento das equipes, não apenas o volume de editais, mas de Ordens de Serviço e mais contratações vão permitir exibir um volume de obras sendo feitas. A meta fixada por ela é de R$400 milhões/mês.
E as equipes do governo pensam em estruturar uma plataforma de acompanhamento de modo a exibir visualmente as ações em todos os municípios apressando o início das obras.
Sem Diário Oficial
Talvez o problema da oposição tenha sido mesmo o fato de ter concentrado sua ação no embate político. Seja na questão das emendas (que, efetivamente, estão com atraso sério de pagamentos), seja na disputa nas comissões. E não ver o que acontecia (ou não acontecia) no Diário Oficial.
Projeto ruim
Entretanto, essa maior dificuldade em mostrar ao público como o Executivo – com tantos empréstimos não gastou um bom volume de recursos – teria sido mais convincente sem a proposta que Antonio Coelho criou. Isso deu à governadora o argumento de perseguição.
Tão forte que, em privado, os deputados da oposição reconhecem que foi um enorme equívoco. Porque prejudicou a seriedade dos confrontos dos dados levantados por outros deputados.
Correndo atrás
Os presidentes das outras comissões estão se esforçando para questionar com apoio técnicos os números do próprio governo com outra visão. Mas propor explocar numeros num embate hoje politico não é fácil.
Eles talvez consigam depois do recesso retardar os novos empréstimos no valor de R$3,2 bilhões. Mas a imagem do projeto feito com base numa conta de padaria extinguiu a oportunidade de se apresentar para uma discussão em melhor nível. O que seria muito bom para a sociedade.